A fascinação pela tentativa de entender os sonhos
Seja no campo da psicologia, da filosofia ou mesmo da arte, essa tentativa de entender o mundo onírico sempre fascinou a humanidade.


Desde os tempos mais antigos, os sonhos provocam uma mistura de encantamento, curiosidade e mistério. Por que sonhamos? O que os sonhos significam? Eles querem nos dizer algo, ou são apenas um emaranhado de imagens sem sentido? Seja no campo da psicologia, da filosofia ou mesmo da arte, essa tentativa de entender o mundo onírico sempre fascinou a humanidade, e continua despertando interesse em pleno século 21.
Sonhar é uma das experiências mais pessoais e universais ao mesmo tempo. Mesmo quem diz que “nunca sonha” na verdade apenas não se lembra. Todas as noites, mergulhamos em realidades paralelas construídas pela nossa mente, com cenários absurdos, memórias distorcidas, desejos ocultos e medos que nem sempre sabemos que temos.
O que são os sonhos?
Do ponto de vista fisiológico, sonhar é um processo que ocorre, principalmente, durante a fase REM do sono – aquela em que o cérebro está mais ativo e o corpo mais relaxado. Nesse estágio, o cérebro processa informações, consolida memórias e, segundo muitas teorias, “organiza” os conteúdos vivenciados ao longo do dia.
Mas há muito mais do que isso. Ao longo da história, os sonhos já foram interpretados como mensagens divinas, janelas para o inconsciente ou até mesmo previsões do futuro. Na Grécia Antiga, acreditava-se que os deuses falavam com os humanos através dos sonhos. No Antigo Egito, havia sacerdotes especializados apenas em interpretar essas visões noturnas. E, em culturas indígenas, os sonhos são vistos até hoje como portais espirituais.
Com o avanço da ciência, o olhar mudou, mas a curiosidade permaneceu. Freud, por exemplo, enxergava os sonhos como uma expressão simbólica dos nossos desejos reprimidos. Jung, por sua vez, os via como manifestações do inconsciente coletivo, um espaço onde símbolos arquetípicos se revelam. Já as abordagens modernas da neurociência preferem ver os sonhos como uma forma do cérebro lidar com estímulos internos e externos de forma criativa e caótica.
O que os sonhos dizem sobre nós?
A verdade é que, mesmo sem consenso, a maioria das abordagens concorda em um ponto: os sonhos refletem algo sobre quem somos. Eles podem revelar ansiedades, vontades, conflitos internos ou simplesmente reorganizar memórias e sensações.
Há quem diga que os sonhos são uma forma de “simular” situações difíceis para treinar a mente emocionalmente. Outros os veem como arte pura, um cinema interno, onde o roteirista é o nosso próprio inconsciente.
Essa ambiguidade entre lógica e ilusão, realidade e fantasia, é justamente o que torna o tema tão fascinante. Assim como no jogo The Legend of Zelda™: Link’s Awakening, onde o universo vivido pelo protagonista parece tão real quanto enigmático, nossos sonhos nos envolvem em narrativas que desafiam a lógica, mas que carregam significados profundos.
É aí que mora o charme: os sonhos permitem uma liberdade que a realidade nem sempre oferece. Voamos, mudamos de forma, revemos pessoas queridas, enfrentamos monstros simbólicos. E, por mais estranho que pareça, tudo parece fazer sentido enquanto dura.
Por que sonhar nos intriga tanto?
Talvez porque os sonhos toquem em algo que temos dificuldade de acessar no estado desperto: o íntimo mais profundo. Neles, somos mais verdadeiros, mais impulsivos, mais livres – ou, dependendo do sonho, mais apavorados. É no mundo dos sonhos que enfrentamos nossos medos mais viscerais e revivemos nossas maiores dores. Mas também é lá que reencontramos o impossível e experimentamos a criatividade em sua forma mais pura.
Não à toa, tantos artistas, escritores, cineastas e músicos encontram nos sonhos uma fonte inesgotável de inspiração. Salvador Dalí, por exemplo, explorava imagens oníricas em suas pinturas surrealistas. Já diretores como David Lynch e Christopher Nolan (com seu A Origem) usam os sonhos para criar narrativas que desafiam o espectador. Até no campo da ciência, sonhos já inspiraram ideias e descobertas, como o caso famoso do químico Kekulé, que sonhou com a estrutura do benzeno.
Essa capacidade dos sonhos de “ligar pontos soltos” e estimular associações criativas é uma das explicações para seu poder. Durante o sono, o cérebro opera em outro ritmo, sem as amarras da lógica linear. É como se ele tivesse liberdade para brincar com ideias, memórias, emoções e símbolos. E, nesse caos, surge o novo.
Interpretar ou apenas sentir?
Outra questão importante: devemos interpretar os sonhos? Depende. Há pessoas que enxergam nos sonhos pistas sobre decisões importantes ou diagnósticos emocionais. Outras preferem simplesmente experimentá-los como manifestações poéticas da mente.
De fato, tentar encontrar significados pode ser útil, principalmente se o sonho é recorrente, impactante ou gera desconforto. Mas também é válido simplesmente sentir, lembrar, anotar, compartilhar. O ato de falar sobre sonhos pode revelar coisas que não percebemos enquanto dormíamos, e até ajudar em processos terapêuticos.
Por isso, muita gente mantém diários de sonhos. Registrar os detalhes logo ao acordar pode ajudar a ampliar o autoconhecimento e até perceber padrões emocionais. Além disso, esses relatos servem como material riquíssimo para quem escreve, desenha, compõe ou cria de alguma forma.
O fascínio continua – e se reinventa
Mesmo com séculos de estudos e teorias, os sonhos seguem misteriosos. E talvez seja isso que nos prenda a eles. Vivemos em um mundo que valoriza dados, explicações e métricas, mas os sonhos escapam de tudo isso. Eles nos lembram que a mente humana ainda guarda segredos e que nem tudo precisa ter uma explicação racional.
Nos últimos anos, inclusive, cresceu o interesse por tecnologias que tentam monitorar ou até influenciar os sonhos. Aplicativos de registro de sono, dispositivos de indução de sonhos lúcidos e pesquisas com inteligência artificial vêm tentando decifrar ou dialogar com o inconsciente. Ao mesmo tempo, temas oníricos voltaram com força na cultura pop, como prova o sucesso de livros e filmes que exploram essa dimensão paralela.
Nas redes sociais, também aumentou o número de pessoas compartilhando sonhos curiosos ou recorrentes. Alguns usuários brincam, outros tentam interpretar coletivamente. Há inclusive comunidades inteiras dedicadas a decifrar significados e padrões. Tudo isso reforça uma ideia: mesmo que os tempos mudem, a curiosidade pelos sonhos permanece intacta.
Um universo que vive dentro de nós
Em um mundo cada vez mais voltado à produtividade e ao racional, os sonhos seguem como um lembrete de que há beleza no mistério. Eles não precisam ser totalmente compreendidos para serem valiosos. Basta sentir, lembrar, refletir – e quem sabe até se inspirar.
Afinal, cada um de nós carrega um universo particular que se manifesta toda noite, enquanto o corpo repousa e a mente se aventura. E mesmo que nem sempre façam sentido, os sonhos têm o poder de revelar verdades que a vigília insiste em esconder. Talvez por isso nunca deixemos de tentar entendê-los e de nos fascinar por eles.