“Essenciais” compartilham rotina de trabalho em meio à pandemia

Segundo Moisés, as dificuldades foram maiores logo no início do isolamento social, quando as oficinas para reparo dos caminhões estavam todas fechadas e o transporte de cargas havia ficado ainda mais urgente.

Após o isolamento social imposto pela pandemia do coronavírus, toda a população constatou a importância de diversos profissionais verdadeiramente essenciais para a manutenção da qualidade de vida das pessoas. Dentre tantos ofícios, em dois deles os profissionais vem reforçando seu papel na sociedade e passaram a assumir riscos diários para ajudar a manter famílias em segurança dentro de casa.

 “Não somos heróis”
“Medo eu não tenho. Uma vez que respeito todas as regras de prevenção, me apego na minha fé”, diz o caminhoneiro Moisés Mendes de Assunção. Há 17 anos o riomafrense garante o sustento da família como transportador autônomo e representa os 67% dentre 2 milhões de caminhoneiros brasileiros que dependem da atividade.  A bordo do VW/14170 fabricado há 20 anos, ele transporta insumos agrícolas, alimentos e madeiras entre São Paulo e os estados do sul do país. 

Moisés recorda dos melhores anos da profissão que permitiram a ele algumas conquistas, como a casa própria e o bem estar dele, da esposa e duas filhas. “Como sou autônomo, procuro sempre aceitar fretes que me permitam estar com elas no fim do dia”, explica.

No entanto, a crise trazida pelo coronavírus deu ao transportador uma responsabilidade a mais nos cuidados com a família. Segundo Moisés, as dificuldades foram maiores logo no início do isolamento social, quando as oficinas para reparo dos caminhões estavam todas fechadas e o transporte de cargas havia ficado ainda mais urgente. “Além dos cuidados com a parte mecânica que acontecem em todas a viagens, havia o medo das pessoas em ter contato com a gente, a falta de atendimento nas estradas e a nossa própria preocupação em não trazer nenhum vírus pra casa”, conta.

Agora com muito álcool gel na cabine e uma coleção de máscaras, Moisés diz que o tratamento das pessoas para com os caminhoneiros mudou muito. “A gente sabe que muitas pessoas têm receio do contato mais próximo o que é natural porque viajamos muito. Mas a gente também percebe um respeito muito grande em cada local que paramos, até mesmo nas blitze policiais temos sentido essa diferença”, relata. 

Ciente da responsabilidade que sua profissão adquiriu, o Dia do Trabalhador de Moisés foi marcado pelo transporte de mais uma carga de insumos agrícolas entre Rio Negro e Paranaguá. “Mas não somos heróis. Somos trabalhadores que sabem que todo mundo precisa viver bem e com qualidade neste momento”, ressalta. 

Mesmo rejeitando a fama de herói, o transportador adianta que um bom reconhecimento para a categoria neste momento seria a criação de um incentivo governamental para que autônomos que possuem veículos muito antigos pudessem renovar a frota neste momento. “No meu caso, uma viagem que levo de 6 a 8 horas para fazer, poderia ser feita em menos de 4 horas, com mais conforto e segurança caso houvesse uma linha de crédito com juro adaptado à nossa realidade”, pondera. No Brasil, a média de idade da frota conduzida pelos autônomos é de 18 anos, enquanto a dos transportadores empregados é de 8,6 anos, de acordo com a pesquisa CNT Perfil dos Caminhoneiros. 

“Trabalho para que as pessoas fiquem em casa”
Ele mal estreou na profissão e já encarou o maior desafio da sua vida. Jefferson Dudat deixou o setor da indústria há um ano e resolveu se tornar motoboy autônomo. O ex-operador de máquinas realiza atualmente o serviço de entregas de alimentos na modalidade delivery, medicamentos e materiais impressos.

Apesar de pouco tempo na profissão, os desafios vividos por Jefferson já são imensos. “A primeira dificuldade foi a adaptação à nova profissão. A segunda, foi após já estar acostumado, enfrentar o pouco conhecimento das pessoas logo no início da pandemia. Muitos vinham até o portão receber produtos com medo de pegar alguma doença”, conta. 

No entanto, o profissional já entendia a importância que seu trabalho viria a adquirir. “Somos essenciais neste momento; quando entrego jornal, estou levando a informação para dentro da casa das pessoas; quando entrego medicamentos, levo saúde a quem não pode sair”, observa. 

Jefferson diz que tem medo de ficar doente e prefere nem pensar muito nisso. “Eu continuo porque minha família depende de mim. Então a gente tem que focar que não pode parar. Se a gente parar, como vão ficar as pessoas que dependem de ajuda, desde a minha família que me apoia todos os dias até a das outras pessoas que estão em casa e precisam deste cuidado”, reforça. 

Para proteger a si mesmo e aos outros, o motoboy passou a adotar diversas medidas de prevenção ao coronavírus. Todo o expediente de entregas é realizado com máscara, que é trocada a cada três horas. A cada entrega, ele utiliza luvas descartáveis e, assim que finaliza o atendimento realiza o descarte das luvas e higienização das mãos. O álcool em gel também se tornou item imprescindível ao trabalho. 

Ele conta que passado o primeiro momento de crise da pandemia, hoje ele acaba se emocionando com o carinho e reconhecimento de algumas pessoas quando recebem seus pedidos. “Há pessoas que nos parabenizam por nos mantermos firmes nesse momento. Hoje me sinto orgulhoso do que faço”, conclui.