Sem lei de preservação, aos poucos, Rio Negro perde seus imóveis históricos

A falta de uma lei que tombe e proteja construções históricas está deixando dezenas de casas serem transformadas em ruínas, junto com a memória da cidade.

Edificação demolida em frente ao antigo Calçadão. Foto: Robson Komochena

 

 

Marcado por inúmeras mudanças durante seu processo de urbanização, Rio Negro ganhou, ao longo dos seus 152 anos, construções icônicas que, sem lei de proteção, estão sendo demolidas.

 

Algumas, para dar lugar a novas e modernas edificações comerciais, outras, apenas por anos de abandono, com estruturas condenadas por cupins, infiltrações e apodrecimento.

 

Vista do mesmo ponto da rua Dr. Vicente Machado, em frente a Praça João Pessoa, na década de 60. Foto: Maria da Glória Foohs/Acervo.

 

A cada ano, o “centro antigo” de Rio Negro sofre baixas em seus casarões centenários. Recentemente, uma edificação em frente ao antigo Calçadão foi ao chão em menos de 24 horas. “Estava condenada, não tinha o que fazer”, comentou um trabalhador durante a demolição.

 

Ainda no centro, outra edificação histórica está em contagem regressiva para virar ruínas: o antigo casarão do Dorison, marcado pelo nome de uma loja de calçados que por anos funcionou no local.

 

Vendida, histórica casa deve ser demolida a partir de março. Foto: Robson Komochena

 

A lendária edificação, bem na saída da Ponte Rodrigo Ajace, na esquina entre as ruas Vicente Machado e Sete de Setembro foi vendida e todos os comerciantes notificados a desocupar o imóvel até o dia 18 de março, quando será iniciada sua demolição.

 

Nos últimos anos, a falta de uma lei que tombe e proteja construções históricas está deixando dezenas de casas, principalmente nas ruas XV de Novembro e Vicente Machado serem transformadas em ruínas, junto com a memória de Rio Negro.

 

Imponente edificação da loja Calçados Dorison, na década de 60. Foto: Maria Glória Foohs/Acervo

 

Pelas redes sociais, historiadores e adeptos da preservação lamentam os fatos. “Impressionante! Rio Negro é um lugar sem memória. Tão destruindo tudo”, lamentou Marlon José.

 

“Para que isso? Tem tanto espaço que poderiam fazer uma nova cidade, mas teimam em arrancar as nossas raízes”, comentou Alvir Ferreira.

 

Ainda, segundo historiadores, a falta de preservação é um problema de muito tempo. Outro exemplo, ainda nos anos 90, foi a demolição da última casa em estilo açoriano da cidade, onde funcionou por décadas a loja de Badia Gibran, na esquina entre as ruas Vicente Machado e Nicolau Bley Neto, que hoje é um terreno vazio.

 

A última casa açoriana de Rio Negro, demolida na década de 90. Foto: Maria da Glória Foohs/Acervo.

 

O que diz a Prefeitura?

Ao Riomafra Mix, a Prefeitura de Rio Negro confirmou, em nota, a facilidade em demolir uma construção, independente da sua idade. “O proprietário do imóvel pode solicitar o Alvará de Demolição através do serviço digital no portal ou presencialmente na Prefeitura. Existe a obrigatoriedade de um responsável técnico (engenheiro) para a realização da demolição”, diz o texto.

 

Indagada sobre a existência de programa ou Lei no âmbito municipal que incentive a preservação, a Prefeitura destacou a Lei 2765/2017, que regulamenta o “Inventário do Patrimônio Cultural dos Imóveis de Rio Negro”.

 

Na prática, o projeto apenas registra a história dos imóveis, mas não os protege. “É um projeto bastante importante para registrar, principalmente, a história dos imóveis que não podem ser tombados fisicamente e que um dia podem, eventualmente, ser desmanchados ou reformados por vontade e/ou necessidade do proprietário”, diz a nota.

 

Sem Lei e força para atuar, a nota explica que a Prefeitura não pode proibir o proprietário de realizar as reformas ou demolições de imóveis particulares. “A gestão vê com tristeza uma demolição de um prédio histórico sendo realizada, mas é um direito do proprietário realizar a obra, reforma ou demolição que achar necessária em sua propriedade”.

 

A nota ainda afirma que o maior patrimônio histórico e cultural do município é o prédio do antigo Seminário Seráfico, com 100 anos. “A Prefeitura mantém constantes investimentos para preservá-lo. Estão em fase de desenvolvimento diversos projetos para aprimorar e preservar o local, como a instalação de um elevador, mas sem prejudicar a estrutura original (pois é um imóvel tombado). Pinturas no prédio e reformas no telhado, por exemplo, também foram realizadas nos últimos anos. Todos os outros imóveis históricos públicos são preservados, como o Arquivo Público Municipal e o antigo prédio do Fórum, no Centro. A Casa Bucovina também receberá mais investimentos em breve”, finaliza o texto.